quinta-feira, 30 de junho de 2016

Amar é foder



Abre os olhos, a boca, as pernas…
deixa que o vento e a chuva te fecundam de prazer,
enquanto destilas fogo, luz e calor…
Despe-te de preconceitos e de pudor,
sê nua, pele com pele, poros húmidos bebendo
no meu ventre água benta…
Sobe ao altar e reza de joelhos,
chupa a hóstia e deixa a saliva derretê-la,
enquanto explodes sobre o tapete vermelho
a heresia de foder.


segunda-feira, 27 de junho de 2016

Terra



Inspira…
cubro-me de ramos e folhas frescas…
…bate-bate… bate-bate… mais rápido… bate-bate…
Veias em contração e extensão,
compressão, distensão…
Nuvens, vento, sol, escuridão…
Expira, alivia, relaxa…
Vento uivando no cume da montanha,
lava escorrendo da cratera em que te escondes.

Inspira, contém, chora…
                Pára… cerra as pálpebras… lambe as feridas…
Rio de lágrimas alagando raízes,
invadindo vísceras em sangue,
salgando carne, conservando dor,
mar revolto cuspindo contra o crânio,
aguaceiro rebentando no teu peito…
Expira, desmaia, uma batida apenas…
Terra infiltrando-se nos poros húmidos,
injetando-te vermes e pasta de folhas secas…


sexta-feira, 17 de junho de 2016

É preciso

É preciso doer, gritar, morder os lábios,
encerrar as pálpebras, chorar…
É preciso esticar o tronco, despir,
pele nua contra o lençol da morte,
pairar sobre o vazio, sentir pender a cabeça
sobre uma almofada de lágrimas espessas
e um tubo sugar-te as entranhas tóxicas
para saíres da sombra onde te escondes.

É preciso cerrar os punhos, prender o último sopro,
projectá-lo nos olhos que se estendem por dentro do corpo…
É preciso saber de que matéria somos feitos,
que fantasmas nos atormentam o pensamento
e chicoteá-los com a serpente que nos lambe o veneno.

É preciso atravessar este caminho íngreme e lúgubre,
partir em direcção ao mar e ao sol,
pisar a areia molhada e saborear a maresia salgada,
voar por dentro para me descobrir
e libertar das lágrimas e da escuridão
que me consomem viva…

É preciso…
para abraçar este novo mundo de magia
que se fecunda em florestas, roseirais e pomares,
voa no dorso das andorinhas, poisa nos ninhos das cegonhas
e mergulha junto de golfinhos, algas e corais marinhos.



quinta-feira, 9 de junho de 2016

O Devir



Corro pela avenida deserta de gente,
despida de vultos e sombras,
ausente de vento e paisagem…

Pálpebras fechadas, pestanas cerradas…
apenas duas lágrimas me aconchegam a face
e me fazem sentir viva…

Corro, esvoaço sobre o mar invisível,
perco-me entre dunas de areia intangível,
absorvo o sal desta água que me toca os lábios
não é fria como a chuva, mas quente…

Nado contra essa corrente morna e transparente
que me inunda o olhar cego
para te colher ainda fresco e sumarento.


Estrada


Asfalto negro e ardente
sob os meus pés nus, sujos de sangue,
feres-me em cada passo sonâmbulo
mas ainda assim calco-te com fervor
esperando arrefecer a lava que te suga e destrói.

Nuvens brancas tingem-se de chuva cinza,
autoestradas de zombies perseguem o abismo
ladeado por pinheiros bravos despidos de folhas.

Vento de leste rebola na terra seca, estéril,
onde resiste uma rosa de espinhos vermelha,
que me bebe a água subterrânea do ventre
e alimenta-se do sémen que destilas
no movimento das placas tectónicas.

Alcatrão negro e escaldante
sob o meu corpo queimado…