quinta-feira, 21 de maio de 2015

Centopeia

Rastejas faminta, trémula
sobre cem tentáculos viscosos
pelo nervo vago e invisível
que amarra o cérebro ao estômago,
condenados a uma prisão em fúria
a uma dicotomia bélica e doentia
entre a prudência racional
e o impulso mais instintivo.

Desvias-te de cada raio de luz
que dispara entre os filamentos nervosos...
Agarras-te às paredes internas do meu corpo,
desfiando golpes profundos que me vêm à boca...
Envenenas-me com a tua gosma ácida,
que deixam um rasto de pegadas de sangue e carne viva
e sucumbo em espasmos contínuos
de lava e cinza!

quarta-feira, 20 de maio de 2015

Verbo indígena

Arranco esse tom frio e áspero
que sufoca o verbo indígena
das tribos vermelhas
que habitam as florestas amazónicas…
essa aguarela gélida e pálida
da paleta de tons poentes e nórdicos
que estrangula a palavra em fúria
que se solta da minha boca,
em golpes de chama, cor de sangue.

Toco-te esse corpo híbrido de escamas e pele
com a língua quente que me lambe as feridas,
as pestanas negras e pesadas de uma noite em claro…
E mergulho nesse rio que explode
em espuma e azul
nos lábios que me suportam o tronco febril e líquido…



Chuva e sal

Sombras de chuva e sal
dançam na minha íris escura,
que se abre em flor para ser tua,
da terra fofa e húmida
de onde brotam caules fortes e copas frondosas…

Bebo a água dos olhos
que se erguem do chão para o sol
do infinito azul para o vazio cálido,
atenuando a luxúria insaciável
que me explode nas veias dilatadas…
Destilo cálices de licor translúcido
sobre corpos ardendo em chamas!