segunda-feira, 18 de julho de 2011

Folha de papel


Confinada a estas quatro finas arestas de cal,
não vejo senão tinta crassa,
manchando-me a pele clara…

Escrevem-me o destino,
limitado a um alfabeto de grades,
entre as linhas oblíquas
que me tolhem a visão sombria.

Fios de luz aquecem-me o corpo gelado,
vêm do calor de uma mão que me guia
neste caminho prumado,
que se espraia no infinito
entre as trevas e a claridade do dia!

quarta-feira, 13 de julho de 2011

Aracnopássaro













Baloiçam-me indigentes
as noites claras nas pestanas escuras
molhadas desse orvalho das folhas
que desliza em finas gotas,
cristais líquidos multicores,
na teia de aranha invisível
em que me seguro das vertigens...
e se me tento desprender para o voo triunfal
esses fios tão finos como um cabelo
transformam-se em grades de aço
e fazem-me cativa do meu próprio dilema...

Serei um aracnopássaro?
Palavra ausente do vocabulário humano,
mas que a natureza reconhece no diário da vida,
entre as linhas tortuosas de quem chora,
porque habita a dualidade de um ser híbrido.

As penas coladas ao leque de filamentos de seda
formam um paraquedas biológico
e servem-me de ferramenta para apanhar a presa...

sexta-feira, 1 de julho de 2011

Possuir-te

Lanço-me no teu dorso despido
sob a cumplicidade da lua cheia…

Cerco-te nesta clareira perfumada de jasmim…
Carne suada, arfar felino
com que te possuo nua,
entre as coxas líquidas
e os lábios cremosos!

Pinto-te os olhos claros
com a minha íris negra e profunda…
Dás-me a vida
e eu dou-te o mar!

Nesta dança de saliva,
pele e curvas,
tinges-me as pregas da alma
num embalo hirto e frenético…
A brisa da noite desliza…
os nossos corpos brilham…
e um grito de águia
dispara como uma flecha no infinito azul!

Pauta molhada



















Desafino na pauta molhada,
chuva desordenada
caindo nesta poça de cor esverdeada…
como se fosse um espelho,
mas fosco e turvo…
Apenas nuances da minha fisionomia
transparecem dessa tela antiga,
pintada a aguarela escura.

Na mão do vento,
o pincel esvoaça, dança,
desenha círculos multicores
entre as nuvens claras e cinzentas…
Molha a ponta no oceano,
agarra um pedaço de azul do céu
e tinge essa água opaca, quase negra,
ressuscitando a vitalidade
de quando não era charco de rua,
mas um rio de caudal veloz e profundo!