Desenho-te curvas, reentrâncias húmidas, nessa tela transparente onde me revejo nua… São tuas estas mãos que te possuem e este corpo inteiro que te circunda como a brisa primaveril despertando-te do sono profundo de Inverno… Bebo-te a seiva que me escorre fluida e morna em cada linha da pele invisível que me veste a alma. Conheço-te o sabor a chuva e a terra queimada, viajei nos teus movimentos perpétuos, curvilíneos, bailarina que ama o sol mas seduz a lua! Numa bipolaridade secreta acaricias-me o rosto cansado enquanto deslizo para o teu colo sereno e verdejante!
Traças-me o corpo com essa invisível capa de cetim, abraçando-me num sopro fresco de inverno pálido que descreve telhados de neve e ramos despidos. Mas o teu hálito escalda-me o ventre em labaredas, libertando esse vapor quente e macio que derrete as pequenas estalactites que nascem em cada braço de ferro: o portão do parque ou o arco sobre o caminho prateado, noutra época verde de folhas de plátanos imponentes que abrigavam rolas e esquilos, rebentos de morango e alecrim. Procuro as horas, os dias e os meses, ininterruptamente como se os devorasse à velocidade dos meus passos nus, que correm sobre o asfalto de gelo escorregadio... Mas o minuto demora-se nas quedas que me golpeiam os joelhos e as mãos... O rosto aninha-se-me nos braços cruzados ao peito quase dormente, enquanto imagino o regresso dos campos verdejantes com os roseirais e as laranjeiras selvagens saciando-se junto da nascente de água morna e cristalina que despertara da estação mais fria do ano.